“Home Taping is Killing Music” era a mensagem que por vezes se encontrava nas capas interiores em papel (enventualmente forradas a plástico por dentro) dos discos de vinilo importados de Inglaterra. O logotipo, com uma cassete e dois ossos cruzados, cita não só a simbologia pirata mas também a morte e constitui um sinal dos tempos em que, tal como hoje, se copiava a música. Mas as diferenças eram muitas, para não dizer substanciais. Estas diferenças podem resumir-se a dois aspectos fundamentais: o formato de cópia e respectivo suporte que não era de todo portátil e a inexistência de redes de partilha que não fossem para além do grupo de amigos do bairro. Assim, havia pelo menos alguém que comprava o disco e que se dispunha a emprestar aos outros para o poderem gravar. E os outros eram um grupo de dois ou três (uma dezena eventualmente) de amigos, que o faziam numa atitude comunitária de partilha, ou seja, eu gasto os meus cobres nestes discos, tu gastas naqueles, e depois trocamos. Havia um genuino prazer de ouvir a música, e houvesse dinheiro nos bolsos para a comprar, ninguém na realidade trocava o vinilo pela fita da cassete que enrolava, ficava gasta, degradava rapidamente e tinha uma qualidade sonora que deixava, e muito, a desejar. Hoje, a internet e a produção musical em formato digital alterou por completo este padrão (de consumo e de atitude) e fez com que este aviso pareça estranhamente obsoleto e exageradamente alarmista à época, fruto de uma indústria que, na altura tal como hoje, conviveu mal com o mercado que quis sempre controlar à força, incapaz de ter visão e prever o alcance e dimensão que o problema tem nos dias de hoje quando os primeiros CDs chegaram ao mercado. Aliás, foi precisamente nesta altura em que a ganância das editoras chegou ao seu grau superlativo quando pairou no ar a morte anunciada do vinilo promovendo assim junto das classes com maior poder de compra a substituição maciça dos seus discos antigos por CD. Um erro crasso de onde todos sairam a perder e mais um exemplo de falta de visão cuja melhor elegia foi escrita por José Vitor Henriques ao afirmar “que o vinilo se vestiu de preto para assistir ao enterro do CD”, e eu acrescento, “...ingloriamente assassinado pelo mp3”. A cópia e distribuição de música tornou-se de tal forma facilitada e generalizada que o seu consumo deixou de ser feito com prazer e reflexão, para passar a ser voraz e urgente, como quem consome compulsivamente e de forma doentia numa sociedade inundada de produtos e informação. A questão já não é ter os discos de que se gosta, é conseguir ter o maior número de discos possíveis. Não importa sequer se temos ou não tempo para os escutar, o que importa é dizer que se ouviu ou conhece o maior número possível de bandas. Mas que outra coisa estaríamos à espera num tempo em que cada vez mais se olha sem ver e se ouve sem escutar?