Saturday 25 April 2009

25 de Abril, Sempre...

Há 35 anos, como agora, continua a fazer sentido e é cada vez mais importante ser recordado.


Cartaz de Vespeira

Thursday 23 April 2009

Dia Mundial do Livro



Que melhor forma de comemorar o dia senão dando a sugestão de leitura de um monumento? Pois é disso mesmo que se trata, "A Condição Humana" de Somerset Maugham é um monumento artístico maior da literatura universal. É também um enorme repositório de ideias onde, curiosamente, vemos escritores de segunda ir buscar "inspiração" disfarçada de quase plágio. Uma vida não merece ser passada sem ter tido a oportunidade de contemplar tamanha beleza. Pena é que não haja nenhuma edição recente em língua portuguesa, restando apenas a dos Livros do Brasil.

Wednesday 22 April 2009

Friday 17 April 2009

Um Eastwood em Grande Forma


Gran Torino de Clint Eastwood é o filme em alta que corre por aí, com rasgados elogios em toda a imprensa e demais meios que falem destes assuntos. Habituei-me sempre a ver Eastwood como o anti-heroi Dirty Harry ou o cowboy solitário e sem nome de O Bom, o Mau e o Vilão de Sergio Leone. No tempo em que ainda andava pelo cinema com muito mais frequência que agora, nunca dei grande conta do Eastwood realizador. Essa percepção mudou com Bird, sobre a vida de Charlie Parker, e manteve-se firme até hoje. Filmes como As Pontes de Madison County e Mystic River são apenas dois exemplos que perduraram na memória depois disso.

Gran Torino é um filme de uma espessura e densidade incomum, daqueles que nos enchem as medidas e os sentimentos (para o bem e para o mal) e nos remoem a cabeça ao retardador. Não sendo um exemplo primoroso de interpretação (não contando com o próprio Eastwood), a sua força está no homem que capta das suas personagens aquilo que quer e Eastwood soube-o fazer com mestria, produzindo um objecto cinematográfico sólido e consistente. Gran Torino revela-nos, acima de tudo, uma grande parábola sobre uma certa América, uma América feita de emigrantes (o protagonista, Kowalski, é de origem polaca) maioritariamente de matriz europeia, que lutou em guerras e que se vê a braços com um mundo em transfiguração. Esta é a América tradicional, profundamente dura, patriota, racista e religiosa (à sua maneira). Esta América está a desaparecer e a transformar-se numa burguesia sem ideais e convicções nem amor pelo próprio país, incapaz sequer de compreender a linha geracional que a procede. Ao mesmo tempo nasce uma outra América, marginal, excluída, culturalmente deslocada e necessariamente sobrevivente e muito agarrada às suas próprias tradições. No fim, não será por acaso que o grande legado da América tradicional, o famoso Ford Gran Torino, vá parar às mãos do jovem Hmong, simbolizando o passar de um testemunho. Será pois o desejo de renascimento de uma nova América que, tal como a anterior, continuará a ser feita de emigrantes, embora de matriz cultural completamente diferente.

Thursday 16 April 2009

Uma Jornada com as Contas Trocadas

No dia de ontem, o Presidente da República decidiu iniciar mais um Roteiro para a Ciência. Estes eventos provocam sempre em mim a necessidade de dizer algo, mas que a seu tempo (talvez uns dias) virão a lume neste espaço. Por agora, apenas quero salientar a necessidade que manifestou em diminiur a iliteracia matemática dos jovens. Creio que nesta matéria esteremos todos de acordo sobre quão urgente e necessária é, mas para isso era preciso esfolar o animal do Ministério da Educação que, há uns anos, obrigou ao uso da calculadora nas aulas de Matemática do ensino Básico e Secundário.

Dito isto, em vez de andarmos com discursos meio pacóvios com declarações de estado sobre coisas importantes, mas vazias de soluções e propostas, revogue-se imediatamente a famigerada medida cujo alcance é equivalente a uma ordem de execução intelectual sumária dos estudantes por um qualquer comité central de Khmers Vermelhos da Educação.

Thursday 9 April 2009

ProgNósticos: Genesis - II

Parte 2

Para ler a primeira parte.

A pedrada no charco veio em 1974 com o álbum The Lamb Lies Down on Broadway. Este disco nasce de uma ideia de Peter Gabriel a partir de uma viagem pessoal interior (assumida), surrealista (what else, vindo de quem vinha) e marcada pela iconografia norte americana resultante de impressões que Gabriel tinha retirado de uma digressão dos Genesis pelos Estados Unidos. O álbum tem um parto, no mínimo, difícil e tem ainda uma extensão natural nas performances ao vivo que se seguiram (algo de ambicioso e nunca visto à época por uma banda rock) e que haveriam de colocar os Genesis na rota do Pavilhão Dramático de Cascais em 1975. A personalidade de Gabriel começava a crescer e com ela cresciam também as vontades de experimentar mais do que a simples música. Esta atitude não era de todo partilhada pelos restantes elementos da banda, o que associado a problemas familiares criou uma tensão e fractura no grupo que se revelaria definitiva. Curiosamente, apesar da música ter estado fundamentalmente a cargo de Banks, Rutherford, Collins e Hackett, com Gabriel nas letras, o conjunto espelhou bem o espírito que os rodeava e o grupo colocou cá fora o seu álbum mais incaracterístico, mesmo para o género, profundamente negro, a trechos possuidor de um brilhantismo extraordinário, experimental (ainda teve uma colaboração pontual de Brian Eno), ecléctico (explorava uma certa variação de géneros) e apesar de se poder reconhecer algum desequilíbrio, com tempo e analisando profundamente, possui uma força incomum mercê de ser tão humanamente imperfeito e mesmo ambicioso. Pese embora a característica conceptual e operática (se assim a quisermos entender), o disco antecipava algumas pistas para o futuro com músicas mais curtas (a maior parte não possui mais que 4 ou 5 minutos, muitas quedando-se entre o pouco mais de 2 a 3 minutos) e desejos de uma rotura com o passado a qual é bem patente até na capa do disco, uma obra dos famosos estúdios Hipgnosis de Storm Thorgerson. Mas não seria exactamente isso que iria acontecer.


Com a saída de Peter Gabriel, os Genesis podiam voltar a ser o que sempre foram, e foi o que aconteceu. Trick of the Tail (1975) representa a continuidade de uma linha interrompida pelo disco anterior. A saída de Hackett em 1976, uma personagem que na realidade nunca parece ter-se integrado verdadeiramente apesar de a sua guitarra ser uma das marcas da banda, apenas acelerou a transformação dos Genesis num grupo pop, grangeando uma popularidade e sucesso como nunca conheceram em qualquer outro momento da sua carreira. Quanto à herança de The Lamb... ela haveria de ser retomada em pleno por Peter Gabriel em 1980, quando concebeu um disco não só magistral como um dos mais importantes da década que continha, entre outros, os clássicos "Games Without Frontiers" e "Biko". Por mera coincidência (ou talvez não) a tourné visitou o mesmo Dramático de Cascais nesse ano, 5 anos após a despedida dos Genesis. Desde então para cá, nem um nem os outros foram vistos por estas paragens. Dos primeiros não há grandes saudades, mas do segundo sentimos falta.

Wednesday 8 April 2009

ProgNósticos: Genesis - I

Parte 1

Para começar a rúbrica que decidi dedicar ao rock progressivo, nenhuma outra banda a poderia abrir senão a da minha eleição: os Genesis. Nada pode explicar, de forma racional, o impacto que uma dada banda tem em nós em momentos fulcrais da nossa vida e que acabam por formar a nossa maioridade musical, independentemente de quão cedo ela nos bateu à porta. No meu caso, foi aos 6/7 anos de idade, mas é óbvio que o irmão mais velho foi fundamental no processo. Tal como cada uma das principais bandas associadas ao rock progrssivo (ou art rock, onde também é por vezes engavetado), os Genesis têm uma identidade própria e única no género. A sua música contém frequentes pinceladas pastorais e é suportada em estruturas acústicas fortes, mas quedarmo-nos por aqui é algo redutor para o que foram fazendo ao longo do seu período mais importante, de 1970 a 1975. Uma banda de meninos de colégio privado, fruto da reunião de dois grupos de amigos, Peter Gabriel e Tony Banks de um lado e Mike Rutherford e Anthony Phillips do outro em 1967, a que se foram juntando uns bateristas pelo meio que não atinavam com o grupo nem o grupo com eles. Basicamente deram em músicos para poderem interpretar o que compunham, já que não encontravam niguém para o fazer. Até neste processo nasceram do avesso, pois normalmente as bandas só encontram o prazer da composição depois de se iniciarem e crescerem na execução musical, geralmente com covers das suas bandas preferidas.



Em 1969 editam o primeiro disco que mais não era que uma emulação dos Bee Gees e que ainda hoje permanece com os direitos na mão do produtor Johnatan King, responsável quer pelo nome da banda quer pelo título do disco, um resultado aliás no mínimo infeliz. Em 1970 assinam com a etiqueta Charisma de Tony Stratton-Smith (que tinha no catálogo os Van der Graaf Generator) e fazem sair o seu verdadeiro primeiro disco, Trespass. Um trabalho algo desequilibrado ainda, mas claramente formador de uma identidade que os caracterizaria nos anos seguintes. Têm em "The Knife" a canção com alma de rock puro e directo demonstrando serem capazes de lidar com agressividade e tensão na música. Esta é também uma marca do guitarrista Anthony Phillips que abandonaria o grupo pouco depois. O lado mais anguloso da música deixaria de se manifestar, e a “agressividade” ia dando lugar aos momentos mais pastorais e estruturados num certo sinfonismo das composições. Não admira pois que nunca tenham sido particularmente amados pela inteligentzia da crítica musical. A formação clássica, com a entrada de Phil Collins e Steve Hackett haveria de tomar forma no álbum seguinte, Nursery Cryme, em 1971, que aliás ainda tem trechos musicais com o cunho de Phillips. No entanto, nota-se que o salto qualitativo musical é substancial, com uma bateria que deixava de ser um mero instrumento para dar ritmo, e passar a ser um instrumento de corpo inteiro enchendo e criando as melodias que se desenvolviam pelas longas composições com 8 a 10 minutos. A guitarra de Hackett, por sua vez, dava ao conjunto a subtileza e requinte de uma voz sólida quer quando entra a apoiar na altura certa a música, ou quando se destaca e toma o comando das operações, que não foram assim tantas vezes quanto isso (os solos de guitarra não eram, de todo, uma característica destes rapazes). Ainda que nos Genesis prevaleça uma democracia no acto criativo da composição musical, e até à saída de Peter Gabriel todas as músicas são invariavelmente assinadas como “Genesis”, torna-se perceptível que são Tony Banks e Peter Gabriel que fazem valer as suas ideias com mais frequência. Os dois amigos de escola representam também as duas personalidades (e principais tensões) subjacentes ao grupo, Tony Banks mais clássico, luminoso e musical, Peter Gabriel mais intenso, criativo e negro. O espaço de actuação do grupo foi-se definindo com o tempo, com Banks a liderar a componente musical e Gabriel a tomar conta da escrita e das performances ao vivo (já que Banks não o deixava mexer nos teclados), que culminou na criação de personagens e uso de fatos e máscaras invulgares (para não dizer estranhos) conjuntamente com pinturas faciais, e que acabaram por der ao grupo uma visibilidade pouco usual tendo em conta o seu estatuto de banda de culto na altura. É neste contexto que colocam cá fora as duas obras seguintes, Foxtrot (1972) e Selling England by the Pound (1973). São obras musicais maduras (para muitos, conforme o gosto, representa o pináculo do grupo) onde os elementos da banda se encaixam na perfeição e onde vão explorando as visões surrealistas de Gabriel, como em “Suppper's Ready”, um dos monumentos musicais do rock digam o que disserem, ou temas tão diversos como a consciência ecológica em ambiente sci-fi apoteótico, revisitação de vivências britânicas a que não são estranhas referências literárias várias e a mais pura exploração da música como veículo de story telling com características de peça de teatro (Gabriel a fazer das suas). Na banda dava para se experimentar de tudo o que lhes viesse à cabeça, e mesmo para os que denotam falta de pachorra para ouvir composições intermináveis, eram capazes de produzir (e produziram várias) composições curtas e simples com os tons pastel de uma tarde outonal num qualquer lugar da Inglaterra rural ou de um passado histórico. Em 1973 até alcançam um certo sucesso com o lançamento do single “I Know What I Like”. Na música dos Genesis, os teclados enchem e dominam as composições mais arrojadas, mas encontram sempre uma secção rítmica de guitarras (mais acústica ou mais eléctrica) por detrás, solidificadas pela bateria de Collins que lhes confere um tom jazzístico inconfundível. A espaços, o tom mais pastoral é evocado pela flauta de Peter Gabriel. Mas a haver sonoridades inconfundíveis estas são sem dúvida os teclados de Banks, em especial o uso do Mellotron (comprado aos King Crimson e com sonoridades que são assustadoramente semelhantes às que encontramos em Exit Music ou Lucky dos Radiohead! Esta observação é claramente uma provocação, mas muitos críticos musicais deram por elas), ou as texturas da guitarra de Hackett que ora lhe fazia soltar um lamento agustiante que nos tocava fundo, ora percurtia as cordas com doses certas de distorção. Mas quando tomamos o conjunto, tudo se encaixa e faz sentido, tal e qual uma jam session inspirada. Na verdade, esta era a forma como verdadeiramente trabalhavam e compunham as suas músicas.