Thursday 30 August 2007

Os Eco-Idiotas

É Agosto, ninguém acha de mau-gosto

Num tempo em que a facilidade de reconhecimento maniqueista do capitalismo americano bom e do comunismo soviético mau se esvaneceu, procuram-se identificar novas referências e causas por que lutar. Os novos contestatários, sem as figuras carismáticas dos regimes revolucionários para os guiarem numa demanda romântica típica dos primeiros anos da juventude, atiram-se ao que apanham pela frente. Uma das causas actuais é a da preservação do meio ambiente. Vem isto a propósito da recente destruição de uma plantação de milho transgénico no Algarve por um bando de arautos da defesa ecológica. A manifestação por causas ecológicas e em prol da defesa do ambiente ou da saude pública são, a meu ver, de importância inquestionável. O que já não é compreensível é que a pretexto disso se prive alguém do seu rendimento vandalizando uma plantação. Aliás, tem-se criado um alarmismo exagerado relativamente aos organismos transgénicos condimentado com muita falta de informação, mas pouca importância se dá à actividade agrícola que faz uso de fertilizantes e pesticidas com um manancial de químicos cujos efeitos imediatos na saúde pública são bem mais graves. Notáveis são igualmente as declarações de Miguel Portas, mostrando simpatia para com a acção mas censurando o facto de se ter atingido um pequeno agricultor. Dá para questionar qual o plafond mínimo a partir do qual a acção passa a ser perfeitamente aceitável. Já estou a ver os activistas a investigarem as declarações de IRS dos proprietários ou o IRC das explorações agrícolas para determinar se a plantação visada cumpre os requisitos para a vandalizarem. Finalmente, creio que só mesmo os elementos de uma sociedade abastada e sem preocupações com a alimentação se lembrariam de cometer tal acto.

O mundo está cada vez mais plural, miscigenado e urbanóide, mas mais igual em termos de referências, nomeadamente por via da sociedade de consumo. A Natureza é algo que está longe, é bonito e importa preservar a todo o custo, mesmo que para isso se tenha que privar os nativos dos paraísos naturais das oportunidades de melhorarem as suas condições de vida, esquecendo-se que a verdadeira preservação da Natureza está na alteração dos (nossos) hábitos de vida no primeiro mundo. Ao mesmo tempo também se vai achando piada fazer férias do tipo “ecológico” em sítios remotos, que não são isentas de impactos negativos para esses locais no pressuposto que o privilégio seja exclusivo dos eco-turistas e vedado às massas. Vão igualmente surgindo formas de vida alternativas que até têm várias virtudes, mas alguns dos seus praticantes revelam certos indícios de intolerância, a exemplo do que li recentemente sobre “veganossexuais” (já haviam os metrossexuais... é mais um género!). Aí, uma adepta afirmava que a ideia de beijar alguém que usa carne na sua dieta alimentar era nojenta. Em primeiro lugar, até desconfio que a autora destas palavras deve ser familiar do Macário Correia. No entanto, gostaria de salientar que considero que cada um é inteiramente livre de seguir os princípios de vida que entender sem que tal me cause qualquer incómodo. Mas isso não me impede de considerar que a forma como a afirmação foi proferida raia uma intolerância típica de algumas seitas religiosas. O espírito de tolerância parece-me um dever cívico básico de cada um de nós e acima de tudo devemo-nos saber respeitar uns aos outros reconhecendo precisamente aquilo em que somos diferentes e não apenas o que temos em comum.


Cartoon de Bandeira, publicado a 20 de Agosto de 2007 no DN (clicar para ver melhor).

7 comments:

extravaganza said...
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extravaganza said...

Ando para abordar este assunto há mais de uma semana lá na tasca, mas sempre que penso num texto para escrever só me vêm à mente palavrões dos pesados para chamar àquela gente que vandalizou a plantação de milho transgénico.

Se não te importas vou colocar 1 link no meu para este blog.

Essa dos veganossexuais também é linda. Não há palavras para isto, Prof!

PS: apaguei o comentário anterior porque acho que me excedi no palavreado... Sorry!

LisbonGirl said...

Apesar do Agosto, foi tudo de muito mau gosto, violento, disparatado e dispensável!

strange quark said...

Pois! Atitudes à parte, o facto é que há muita má informação sobre os OGM (Organismos Geneticamente Modificados). A começar pelo facto de a maior parte da nossa alimentação ser constituida por essas espécies há já uns anos, nem os vegans escapam, se é que não são os mais atingidos. Agora, pensemos um bocadinho: as laranjas que vêm da África do Sul, os kiwis que vêm da Nova Zelândia, as bananas que vêm da Colômbia, ou as maçãs que vêm da Argentina, alguém acha que essa fruta, depois de percorrer essa distância extraordinária e ainda se apresentar com um aspecto atraente num local próximo de nós, não é um OGM?

extravaganza said...

Lembro-me bem de ter dado este assunto na Biologia do 12.ºano em 1990!!! Que a manipulação genética em vegetais/frutas se faz desde há não sei quanto tempo! É deixá-los falar! :)

Eu não olho nada com bons olhos aquelas salsichas de soja (por exemplo)... Ainda não me dei ao trabalho de ler 1 rótulo, mas aquilo deve ter um rol de aditivos interminável!!

O Puto said...

É só disparates por parte dos intolerantes. Não se apercebem que essas atitudes geram ainda mais intolerância.
Quanto a outras questões relativas a vegetarianismo e veganismo, transcrevo um comentário que coloquei noutro blog:
Mete-me impressão os substitutos da carne (sim, por mais que me queiram convencer, aquilo é uma forma de substituir a saudade da carne), precisamente porque se esqueceram de um pormenor muito importante: do courato e das restantes pequenas gorduras próprias dos tecidos animais.
Quanto ao "veganismo", só umas coisitas: nada no inverno substitui uma confortável camisola de lã, nada dá mais estilo que um belo casaco de couro, nenhum remédio é tão saboroso quanto um copo de leite quente com mel. Que será feito das curas para as gripes sem o "abifa-te, avinha-te e abafa-te"? E mesmo em relação à suadela a quatro joelhos, tratamento milenarmente recomendado para muitos males, não acredito que um "vegan" ou vegetariano tenha a mesma performance, pois aquelas proteínas animais garantem a agressividade contida que toda a gente aprecia (mesmo que seja só à vezes). Pronto, já disse!

Anonymous said...

Well written article.