Tuesday 11 March 2008

Crónicas da Mediocrilândia

Este fim de semana estive no evento AudioShow 2008 organizado pela revista Audio e Cinema em Casa, a convite de um amigo e fabricante nacional de amplificadores de potência a válvulas. Mas não irei falar do evento em si, tão somente de um pequeno episódio. Num país pequeno como o nosso, ao fim de um tempo numa dada tribo acabamos por conhecer meio-mundo nesta área, e precisamente numa dessas conversas de ocasião com um velho conhecido, acabei por falar também com um músico da Orquestra Gulbenkian. Entre os quatro que ali estávamos veio à baila o prestígio internacional que a orquestra granjeia, sendo frequentemente convidada para actuar nos mais prestigiados palcos da música erudita a nível mundial. Neste canto, de onde a mesma orquestra é originária, nem uma palavra. Um muro de silêncio tão diligentemente erguido que ensurdece por completo a nossa capacidade de discernimento entre o acessório e o essencial para a cultura e as nossas vidas. Após um dos presentes ter elogiado o concerto que tinha assistido da Orquestra Gulbenkian na véspera, nota que nem uma linha é escrita sobre o evento em jornais de referência da nossa imprensa escrita. Muito disto se explica pela falta de tradição musical na sociedade portuguesa. Somos musicalmente incultos e parecemos muito satisfeitos com esse facto. Daqui se justifica, em parte, o porquê de tanta produção nacional ao nível da música popular ser de uma qualidade confrangedora. A pouca que escapa vem da esfera do jazz e não será por acaso, demonstrando que a educação musical séria serve, afinal, para alguma coisa. Também não deixo de estabelecer uma relação entre este estado de coisas e a reforma preparada no Ministério da Educação para o ensino da música. Mais uma vez demonstramos que estamos a ser, no mínimo, uns autênticos burgessos a lidar com esta situação, levando uma ministra que nem classe tem para ostentar tal posição, a proferir afirmações populistas sobre o carácter esbanjador e elitista que o ensino da música comporta actualmente. O problema é que, para o menos informado e atento, este argumento colhe apoios. E de uma vez por todas vamos assumir se queremos ou não investir em valores da educação e cultura, sabendo nós que ensinar música às massas é importante, mas para quem quiser estudar música a sério sem comprometer as restantes vias profissionalizantes do ensino (e há muitos que querem) o ensino tem de manter o seu carácter singular, de um professor para um aluno nas classes de instrumento, mantendo igualmente a integração entre o sistema de ensino público e as escolas de música (Conservatório, Gregoriano, etc.). O que se pretende fazer não é mais que destruir expectativas cerceando as hipóteses de desenvolvimento e aperfeiçoamento musical dos naturalmente mais dotados e apaixonados da música e no fundo passarmos a ser como o Zézinho bem português, obrigando o dotado a ser tão medíocre como todos os outros, pois só assim a mediocridade geral passa despercebida. E se alguém não compreende como é possível a classe dirigente deste país promover estas propostas, a resposta é muito simples: são tão medíocres como nós!

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