Saturday 10 October 2009

O Que Fazer Para Ganhar um Nobel da Paz

Em tempos, mais concretamente em 1968 ou por aí perto, Hans Krebs (o tal do ciclo) deu uma palestra na abertura do departamento de Bioquímica da Universidade Inglesa de Newcastle upon Tyne cujo título era esse mesmo: como se tornar um laureado com o Prémio Nobel? Daí nasceu uma das mais inspiradas peças de reflexão sobre a investigação científica e como o ambiente e a envolvência em equipa assim como a herança dos mestres são fundamentais para se vir a ter sucesso na matéria. Esse texto foi publicado na revista Nature e garanto que quem o lê pela primeira vez fica com a sua vida e forma de olhar a ciência profundamente modificada.

Pois bem, nesse sentido, pus-me a cogitar sobre o problema: o que fazer para ganhar um Nobel da Paz? Como parte do problema já estava tomado pelo Krebs, e não verei forma de alguma vez este texto vir a ser publicado na Nature, lembrei-me precisamente do Nobel da Paz. Acontece que para mim, o prémio encerra uma contradição na sua atribuição. Teria por garantido que tipos que são profundamente pacíficos e pacifistas, que não fazem mal a uma mosca, convivendo alegremente e em harmonia com toda a espécie de humanidade que por aí anda, seriam os candidatos na linha da frente. Mas depois uma pessoa reflecte mais profundamente e chega à conclusão que estes tipos, na realidade, não dão motivos nenhuns sequer para a existência de um prémio destes. Que sentido fará dar um prémio a alguém que luta pela Paz quando toda a gente vive em plena harmonia entre si? Nenhuma dessas pessoas, na realidade, luta pela paz. Elas vivem em paz. Para quê lutar por uma coisa que têm em demasia na sua vida? Não fazendo esforço absolutamente nenhum, têm precisamente o que querem. Não esperem que alguém lute para arranjar comida num banquete que a tem em quantidade suficiente para alimentar 10 vezes o número de convivas que por lá passeiam. Não faz sentido nenhum. Creio que o comité que atribui o Nobel da Paz deve ter chegado à mesma incongruência que qualquer cidadão com dois dedos de testa chegaria. Têm de ver a coisa de outra maneira. Então, se um tipo gosta de lutar pela paz, quer ganhar um Nobel na categoria, mas não tem nenhum motivo para lutar por ela porque já toda a gente vive em paz, o que vai fazer então? Uma hipótese é começar a lançar boatos na opinião pública, sobre as tendências sexuais desviantes do vizinho, ou sobre as burlas torpes do patrão, ou sobre as sacanices baixas do colega. Assim, pode começar a chegar a algum lado. O pessoal de repente já não anda todo com boa cara. Há assim uns tipos que já vão de trombas na rua para saber quem foi o cabrão que disse aquelas nojeiras sobre a sua pessoa lá no bairro. Mas ainda assim, não é suficiente. O que para aí não faltam são desaguisados do género que se desvanecem no meio de uns copos ou de umas palmaditas nas costas. Isto nem sequer é mediático. A coisa tem de ser em grande, para ter impacto. Então, e se um tipo achar que deve pôr na linha a horda de bárbaros que nem sequer fala a sua língua, professa a sua religião, tem recursos naturais que era melhor sermos nós a controlar e que nos deveria prestar vassalagem quando pretendemos impor as nossas visões aos outros? E se essa horda de bárbaros não aceita as nossas condições? Vai daí, lançamos uma espécie de boato exemplar que mete as hordas de bárbaros a lutar entre si, de forma sanguinária, destruindo a estrutura social, as famílias, a cultura e tudo o mais que possa ser devorado pela guerra. Assim sim, o nosso aspirante a premiado (que definitivamente não é, nem nunca pode ser, um bárbaro) já tem uma causa por que lutar: pôr aquela horda de bárbaros a entenderem-se entre si e a convecê-los que assim não vão a lado nenhum. Não só acaba por ter esperança de conseguir os seus intentos, como oferece, de forma desinteressada, ajuda económica a troco de pouca coisa, que no fundo não é mais do que pretendia desde o início. E no fim ainda ganha um prémio: o Nobel da Paz. Isto porque finalmente percebeu, tal como o comité que o promove, que sem haver quem promova a guerra, não faz sentido haver quem lute pela Paz. Como eu gostava de viver num Mundo sem laureados com o Nobel da Paz.

Hoje, dia 10 de Outubro de 2009, é o Dia Mundial contra a Pena de Morte, e os Estados Unidos foram o sexto país com mais execuções de condenados à pena capital no ano transacto, segundo relatórios internacionais. Diria que, para bom entendedor meia palavra basta.

1 comment:

muguele said...

É bem!!!

Mas será assim tão difícil ver estas verdades?

Aparentemente sim, pois é...