Berardamerda de País
A abertura do tão propalado Museu Berardo, Colecção de Arte Moderna e Contemporânea tem feito gastar muita tinta e alguma saliva na comunicação social. Uns apoiam, outros contestam e outros ainda, nem por isso ou talvez sim. Mais recentemente, após a data de abertura do Museu que ocupa os espaços do CCB, veio ao de cimo a divergência entre o senhor Comendador e António Mega Ferreira. Não sei de pormenores, mas no blog Sound+Vision, essa polémica até me parece bem comentada por João Lopes no essencial que importa dizer sobre a mesma. A minha questão é, aliás, completamente diferente e resume-se à oportunidade (ou oportunismo) de tal iniciativa proposta por um senhor Comendador, título que nem sei bem o que quer dizer (é como o Intelectual).
O senhor Joe (ou será José?) Berardo tem na sua posse uma colecção de arte contemporânea que, segundo especialistas, está entre as melhores a nível mundial. Valendo-se desse facto, o estimado senhor faz ao governo desta espécie de país uma proposta para que a sua colecção de arte fique residente no que diz ser o seu país de origem. Revelando um sentido patriótico sem precedentes, mas não renegando a sua veia para o negócio do tipo merceeiro, quer contrapartidas financeiras do estado e, para além disso, um espaço público para expor a sua colecção. O seu sentido patriótico ficou até muitíssimo bem patente com a chantagem (sim, chantagem!) de levar a sua colecção para outro país se não visse satisfeitas as condições que impôs ao Estado. Perante a opinião pública, Berardo mostra-se como um patrono das artes e da cultura em Portugal, mas só engole a patranha quem não consegue distinguir o sabor de um limão do de uma azeitona. Assim, amarra-se o generoso espaço do CCB a uma exposição fixa, em detrimento de muitas outras que por ali tinham condições de serem exibidas com sucesso, com uma programação incerta em função de um orçamento a curto prazo vindo do erário público. Um bom negócio para o Comendador, um mau negócio para todos nós. O problema aqui é que Berardo vê a sua colecção como mais uma fonte de rendimento e nunca como um verdadeiro objecto de cultura. Quanto a prejuízos, se os houver, serão acarretados pelo Estado. Assim, até um mentecapto com cérebro de galinha e destreza de uma preguiça consegue fazer fortuna a vender dicionários no Bangla Desh. Se isto é sentido de cultura e filantropia, que dizer de um Calouste Gulbenkian que ainda por cima era arménio? Ninguém viu Berardo usar da sua imensa fortuna, ou sequer das mais-valias das suas recentes especulações financeiras que são mais que suficientes para construirem um edifício condigno para albergar a sua colecção. Em toda a sua acção, não há um único gesto filantropo, somente há negócio e uma atitude nos antípodas do que se passa em países civilizados, onde muitas fortunas criadoras de Fundações são fonte de investimento nos valores da educação, saúde e cultura. Aqui, como já afirmou em tempos Miguel Sousa Tavares, são meros expedientes para fugir ao fisco ou arrecadar mais uns trocos. Justiça seja feita ao falecido António Champalimaud pela forma como decidiu aplicar uma parte substancial da sua fortuna. Mas para que seja reconhecido o mesmo estatuto a Berardo era preciso que ele tivesse algo que nunca o dinheiro conseguiu ou conseguirá comprar.
14 comments:
Acrescente-se a isso tudo o facto desse ser agora opinar em tudo o que é vida portuguesa, seja política, desportiva ou o raio que o parta! E mais grave, com cobertura dos meios de comunicação social!! Não gosto deste homem a quem é dado tempo de antena por nada e por coisa nenhuma!!
Estou completamente de acordo contigo!
É assim... uma democracia doente com uma população impávida que gosta de ser vampirizada...
O desconforto está implantado. E a coragem para enferntar onde é que está? Quem avança? hum...
Fica Bem
Obrigado pelos vossos comentários.
Cheguei a discutir com colegas esta questão do Museu e das obras de arte do Berardo, e imediatamente vieram para o meio da discussão nomes como os de Gulbenkian ou mesmo Guggenheim cujas respectivas Fundações têm objectivos muito concretos. O que se passa com a dita Fundação Berardo ninguém percebe muito bem, a começar por a mesma ir ocupar espaços públicos, com os quais não gastou um tusto. Incentivos à cultura são importantes, mas há limites quanto à forma como se processam.
Aparentemente vemos também Berardo já a avançar para outro importante projecto culural: o Benfica! :P
Será alguma fixação com os B's? CCB (Centro Cultural Berardo) e SLB (Sport Lisboa e Berardo)? Quanto ao Benfica, pouco me importa. O que realmente tenho pena é que o Santana Lopes seja do Sporting! :)
E ainda levou uns trocos para casa... 3 milhoes o que é isso...
Pseudo-filantropia, senão mesmo pseudo-tudo!...
Tbm gostei muito do texto do João Lopes. Ele é de uma lucidez desconcertante. abraços. E ja foste ao Berardo?
LisbonGirl: "diz que é uma espécie de filantropo" :)
Wellington, sejas bem aparecido! Concordo com a tua opinião sobre o João Lopes, apesar de ter escrito agora um texto sobre a hipocrisia por detrás do Live Earth e com o qual não concordo totalmente. Por mim acho que é mesmo hipócrita, e quem nele participa deveria reflectir essa atitude no seu dia-a-dia, sem desculpas ou falsos moralismos, embora admita que todos nós temos telhados de vidro. Mas se vamos por esse caminho também não contestamos nada, e o importante é sabermos reconhecer os nossos defeitos e tentar mudar a nossa atitude.
Quanto à famosa colecção Berardo, ainda não vi, mas tenciono, um dia, ver. Talvez depois de passar a "Estação Idiota".
Um abraço
:)
Vais vê-la, no domingo?
Na Culturgest, se tiveres mais de trinta anos, pagas vinte euros, se tiveres menos, pagas vinte! Também é uma "espécie" de critério!!!!!!!
Está visto que aqui temos todos menos de 30 anos...
Todos!... Muito menos de 30 anos...
:)
Olá! Gostei aqui do estaminé! O José Berardo é um novo-rico com olho para o negócio. Teve sorte de arranjar um consultor que lhe construiu uma colecção fabulosa, a qual ele apenas preza pelo valor económico. E de facto, ele fez aqui um negócio muito bom - tem benefícios fiscais, etc, e ainda poupa na conservação da colecção, que essa é o estado que banca!
Honestamente, o homem não tem um pingo de cultura naquele corpo. Quem exibe móveis do séc.XVI sem qualquer protecção, ao alcance da mão de qualquer um, e permite que os seus convidados pousem copos em cima de genuíno mobiliário arte nova não merece o meu respeito intelectual
Ah, e pérolas como "agente tamos aqui" e "podemos mudar de sexo mas nunca mudamos de clube" também não ajudam!!! ;P
fica bem!
LisbonGirl: parece que estou "Em Busca do Tempo Perdido" :(. Nota-se até no blog... a Laurie Anderson é mais uma que deixo para trás.
Betty: benvinda a este espaço virtual, e essas pérolas do Berardo dizem, de facto, mais do alguém conseguiria sintetizar sobre a sua pessoa.
O homem é um oportunista. E o nosso governo criou essas oportunidades. Detestei a forma como Serralves foi desvalorizada face a esta nova coqueluche cultural.
A desvalorização de Serralves é mais um sinal do culturalismo bacoco da nação. Só estive em Serralves uma vez, em 2000, antes de se verificar a expansão na oferta cultural da Fundação, que o pessoal de Lisboa, muito sinceramente, nem se apercebe da qualidade da mesma. Creio mesmo que essa oferta, dentro do seu contexto, será comparável a uma Gulbenkian.
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